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A história de Danylo

 

A história de Danylo

Kherson, sul da Ucrânia

Alla Yatsenyuk
Legenda da foto,

A BBC acompanhou Alla Yatsenyuk e um grupo de outras mães enquanto elas se dirigiam à Rússia para salvar seus filhos

Durante seis meses, Alla Yatsenyuk viveu com a sensação de que uma parte de si mesma estava faltando.

Quando ela enviou seu filho de 13 anos para um acampamento na Crimeia, ela pensou que Danylo iria passar duas semanas perto do mar. Era para ser uma pausa do estresse da guerra: outras crianças de Kherson tinham visitado o acampamento e voltaram, então Alla não estava preocupada.

Além disso, a cidade deles estava ocupada desde o início da invasão e, em outubro de 2022, ela começou a pensar que a Rússia controlaria Kherson para sempre, embora ela não desejasse isso.

Mas dias depois de Alla deixar Danylo no acampamento, os funcionários responsáveis por ele anunciaram que as crianças não voltariam. Os russos começaram a se retirar de Kherson. Se os pais das crianças os quisessem de volta, eles deveriam vir buscá-los.

Alla implorou à administração regional, mas foi informada de que só devolveriam as crianças "quando Kherson voltasse a ser russa".

Ela ligou para o Ministério Público na Crimeia, mas eles insistiram que ela mesma deveria ir buscar Danylo.

E assim, durante semanas, Alla continuou prometendo ao filho que iria buscá-lo, mesmo sem saber exatamente como.

A distância de Kherson a Yevpatoria é curta, mas a rota direta foi fechada pelos militares russos e o caminho mais longo por Zaporizhzhia era muito perigoso. "Havia menos de 5% de chance de chegar lá e voltar com segurança", disse Alla.

Ela também precisaria juntar cerca de US$ 1,5 mil (R$ 7,5 mil) para pagar um motorista, bem como tirar seu primeiro passaporte e toda a papelada que os russos exigem para provar seu vínculo com o filho.

Alla já estava começando a se desesperar quando Danylo disse que os funcionários de seu acampamento estavam ameaçando colocar as crianças sob custódia de outras famílias se os pais não se apressassem.

"As crianças estão nos ligando em pânico, dizendo que não querem acabar em outras casas", conta Alla. "E a Rússia é enorme! Como iríamos encontrá-los?"

Nós nos conhecemos quando ela finalmente partiu em um vagão de trem cheio de outras mães e avós na jornada mais angustiante de suas vidas.

As mulheres estavam sendo ajudadas por um grupo chamado Salve a Ucrânia, que interveio quando se descobriu que centenas de crianças ucranianas poderiam estar presas.

Algumas delas pertenciam a famílias disfuncionais ou menos abastadas, que tiveram dificuldade para acertar a logística e financiar a viagem. Outros pais estavam hesitantes em levar os filhos de volta para as suas cidades, atacadas constantemente pelos russos.

Mas Alla não podia esperar mais.

"Ainda tenho essa preocupação persistente de que algo vai dar errado. Não vai passar até que eu tenha meu filho ao meu lado. Só então poderei respirar novamente."

Mais de uma semana depois, Alla foi uma das últimas mães a cruzar a fronteira de Belarus, de volta para a Ucrânia arrastando uma mala e com Danylo ao seu lado, sorrindo.

Danylo
Legenda da foto,

Danylo (centro) ao cruzar a fronteira da Bielorrússia para a Ucrânia depois de meses longe de casa

Houve momentos em que ela pensou que não conseguiria.

A organização Salve a Ucrânia instruiu que as mulheres desligassem seus telefones quando entrassem na Rússia, então os detalhes de sua jornada traumática só foram conhecidos pelos demais familiares e amigos quando ela retornou.

"Eles nos mantiveram como gado, separados de qualquer outra pessoa. Catorze horas sem água, sem comida, nada", descreveu Alla sobre período em que ficou detida pelo serviço de segurança FSB da Rússia em um aeroporto de Moscou.

"Eles continuaram nos perguntando que equipamento militar tínhamos visto, verificaram nossos telefones um milhão de vezes e perguntaram sobre todos os nossos parentes."

As mulheres continuaram a viagem de 24 horas para o sul até a Crimeia. Ao se aproximarem, pararam para descansar e Olha Kutova, de 64 anos, deu alguns passos, desmaiou e morreu na beira da estrada. Após dias apertada em um micro-ônibus, em estado de estresse, seu coração havia parado.

Agora a Salve a Ucrânia está tentando devolver as cinzas de Olha para a Ucrânia, assim como sua neta.

Eventualmente, Alla chegou ao acampamento.

"No momento em que vi meu filho correndo em minha direção em lágrimas, compensou tudo o que passamos", Alla descreveu sobre seu reencontro com Danylo.

O filho dela me disse que foi "simplesmente brilhante!"

A Salve a Ucrânia conseguiu resgatar 31 crianças naquele dia e várias confirmaram que a equipe do acampamento havia ameaçado colocá-las para adoção, o que as assustou.

Eles falaram sobre serem levados em excursões no início e serem razoavelmente alimentados e vestidos. Mas em território controlado pela Rússia, eles foram tratados e ensinados como russos. Quando os inspetores vinham de Moscou, os ucranianos tinham que se alinhar ao lado da bandeira russa e cantar o hino russo.

Em outubro, a administração que controla Kherson postou um vídeo no Telegram de um desses momentos. O hino da Rússia ressoa nos alto-falantes e a bandeira tricolor é hasteada.

Mas, olhando um pouco mais de perto, fica claro que nenhum dos lábios das crianças está se movendo.

O operador da câmera de repente percebe que uma garota está com as mãos sobre os ouvidos para bloquear o som e desvia rapidamente a imagem.Kherson, sul da Ucrânia

Alla Yatsenyuk
Legenda da foto,

A BBC acompanhou Alla Yatsenyuk e um grupo de outras mães enquanto elas se dirigiam à Rússia para salvar seus filhos

Durante seis meses, Alla Yatsenyuk viveu com a sensação de que uma parte de si mesma estava faltando.

Quando ela enviou seu filho de 13 anos para um acampamento na Crimeia, ela pensou que Danylo iria passar duas semanas perto do mar. Era para ser uma pausa do estresse da guerra: outras crianças de Kherson tinham visitado o acampamento e voltaram, então Alla não estava preocupada.

Além disso, a cidade deles estava ocupada desde o início da invasão e, em outubro de 2022, ela começou a pensar que a Rússia controlaria Kherson para sempre, embora ela não desejasse isso.

Mas dias depois de Alla deixar Danylo no acampamento, os funcionários responsáveis por ele anunciaram que as crianças não voltariam. Os russos começaram a se retirar de Kherson. Se os pais das crianças os quisessem de volta, eles deveriam vir buscá-los.

Alla implorou à administração regional, mas foi informada de que só devolveriam as crianças "quando Kherson voltasse a ser russa".

Ela ligou para o Ministério Público na Crimeia, mas eles insistiram que ela mesma deveria ir buscar Danylo.

E assim, durante semanas, Alla continuou prometendo ao filho que iria buscá-lo, mesmo sem saber exatamente como.

A distância de Kherson a Yevpatoria é curta, mas a rota direta foi fechada pelos militares russos e o caminho mais longo por Zaporizhzhia era muito perigoso. "Havia menos de 5% de chance de chegar lá e voltar com segurança", disse Alla.

Ela também precisaria juntar cerca de US$ 1,5 mil (R$ 7,5 mil) para pagar um motorista, bem como tirar seu primeiro passaporte e toda a papelada que os russos exigem para provar seu vínculo com o filho.

Alla já estava começando a se desesperar quando Danylo disse que os funcionários de seu acampamento estavam ameaçando colocar as crianças sob custódia de outras famílias se os pais não se apressassem.

"As crianças estão nos ligando em pânico, dizendo que não querem acabar em outras casas", conta Alla. "E a Rússia é enorme! Como iríamos encontrá-los?"

Nós nos conhecemos quando ela finalmente partiu em um vagão de trem cheio de outras mães e avós na jornada mais angustiante de suas vidas.

As mulheres estavam sendo ajudadas por um grupo chamado Salve a Ucrânia, que interveio quando se descobriu que centenas de crianças ucranianas poderiam estar presas.

Algumas delas pertenciam a famílias disfuncionais ou menos abastadas, que tiveram dificuldade para acertar a logística e financiar a viagem. Outros pais estavam hesitantes em levar os filhos de volta para as suas cidades, atacadas constantemente pelos russos.

Mas Alla não podia esperar mais.

"Ainda tenho essa preocupação persistente de que algo vai dar errado. Não vai passar até que eu tenha meu filho ao meu lado. Só então poderei respirar novamente."

Mais de uma semana depois, Alla foi uma das últimas mães a cruzar a fronteira de Belarus, de volta para a Ucrânia arrastando uma mala e com Danylo ao seu lado, sorrindo.

Danylo
Legenda da foto,

Danylo (centro) ao cruzar a fronteira da Bielorrússia para a Ucrânia depois de meses longe de casa

Houve momentos em que ela pensou que não conseguiria.

A organização Salve a Ucrânia instruiu que as mulheres desligassem seus telefones quando entrassem na Rússia, então os detalhes de sua jornada traumática só foram conhecidos pelos demais familiares e amigos quando ela retornou.

"Eles nos mantiveram como gado, separados de qualquer outra pessoa. Catorze horas sem água, sem comida, nada", descreveu Alla sobre período em que ficou detida pelo serviço de segurança FSB da Rússia em um aeroporto de Moscou.

"Eles continuaram nos perguntando que equipamento militar tínhamos visto, verificaram nossos telefones um milhão de vezes e perguntaram sobre todos os nossos parentes."

As mulheres continuaram a viagem de 24 horas para o sul até a Crimeia. Ao se aproximarem, pararam para descansar e Olha Kutova, de 64 anos, deu alguns passos, desmaiou e morreu na beira da estrada. Após dias apertada em um micro-ônibus, em estado de estresse, seu coração havia parado.

Agora a Salve a Ucrânia está tentando devolver as cinzas de Olha para a Ucrânia, assim como sua neta.

Eventualmente, Alla chegou ao acampamento.

"No momento em que vi meu filho correndo em minha direção em lágrimas, compensou tudo o que passamos", Alla descreveu sobre seu reencontro com Danylo.

O filho dela me disse que foi "simplesmente brilhante!"

A Salve a Ucrânia conseguiu resgatar 31 crianças naquele dia e várias confirmaram que a equipe do acampamento havia ameaçado colocá-las para adoção, o que as assustou.

Eles falaram sobre serem levados em excursões no início e serem razoavelmente alimentados e vestidos. Mas em território controlado pela Rússia, eles foram tratados e ensinados como russos. Quando os inspetores vinham de Moscou, os ucranianos tinham que se alinhar ao lado da bandeira russa e cantar o hino russo.

Em outubro, a administração que controla Kherson postou um vídeo no Telegram de um desses momentos. O hino da Rússia ressoa nos alto-falantes e a bandeira tricolor é hasteada.

Mas, olhando um pouco mais de perto, fica claro que nenhum dos lábios das crianças está se movendo.

O operador da câmera de repente percebe que uma garota está com as mãos sobre os ouvidos para bloquear o som e desvia rapidamente a imagem.

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