A história de Sasha
Kupyansk, nordeste da Ucrânia
Sasha é um garoto alto e tímido com uma longa franja que ele gosta de alisar, como muitos outros adolescentes de sua idade.
A separação forçada da família seria perturbadora para qualquer criança. Para alguém vulnerável, como Sasha, foi uma experiência ainda mais traumática.
Sua mãe, Tetyana Kraynyuk, me disse que ele ainda está retraído, meses depois de ter voltado para casa. O garoto de 15 anos também desenvolveu cabelos grisalhos de tanto estresse.
Eles agora vivem na cidade de Dinklage, no oeste da Alemanha, como refugiados. Depois da escola, Sasha passa a maior parte do dia deitado na cama, jogando no telefone.
Mas ele se lembra muito claramente do momento em que os soldados russos o levaram embora.
"Para ser honesto, foi assustador", Sasha admite em voz baixa, esfregando as mãos para frente e para trás nas coxas. "Eu não sabia para onde eles iriam nos levar."
Quando pergunto sobre a saudade da mãe, ele faz uma longa pausa, diz que é muito angustiante relembrar o tema e pergunta se pode mudar de assunto.
Antes da guerra, Sasha frequentava a Escola Especial Kupyansk, no nordeste da Ucrânia. Ele passava a semana no local, voltando para casa nos fins de semana.
Mas quando a Rússia invadiu o país em fevereiro de 2022, grande parte da região de Kharkiv foi ocupada e Tetyana decidiu manter o filho em casa por segurança.
Por volta de setembro, quando começa o ano escolar na Europa, Moscou passou a insistir que todas as crianças voltassem à escola, agora com um currículo russo.
Uma campanha similar foi organizada em todas as áreas ocupadas, muitas vezes usando professores da Rússia para substituir os locais, que se recusaram a colaborar.
Tetyana estava relutante em mandar Sasha de volta, mas o adolescente parecia entediado depois de sete meses em sua aldeia. Então, em 3 de setembro, ela o deixou em Kupyansk.
Dias depois, as forças ucranianas lançaram uma operação relâmpago para retomar a região.
"Ouvimos o barulho a quilômetros de distância. Os estrondos. Depois os helicópteros e os disparos. Foi um barulho terrível. Então vi os tanques e a bandeira ucraniana", lembra Tetyana sobre a contra-ofensiva.
Incapaz de entrar em contato com o filho, ela estava desesperada. "Quando chegamos à escola, só restava o zelador. Ele disse que as crianças haviam sido levadas e ninguém sabia para onde", diz Tetyana.
Um professor viu o que aconteceu naquele dia, quando até 10 soldados russos fortemente armados "invadiram" a escola.
"Eles não se importaram em pegar nenhum documento ou entrar em contato com os pais", relatou Mykola Sezonov, quando nos encontramos em Kiev. "Eles apenas enfiaram as crianças em um ônibus com alguns refugiados e foram embora."
Apresentei a ele a defesa da Rússia nesses casos: que o país estava afastando as crianças do perigo.
"Vivi sob a ocupação russa e sei a diferença entre o que eles dizem e o que eu vejo pela janela", foi a resposta do professor.
Por seis semanas, não houve notícias das crianças.
"Eu chorava todos os dias, ligava para a linha direta e dizia que havia perdido meu filho e escrevia para a polícia. Tentamos encontrá-lo por meio de voluntários", diz Tetyana.
Passou-se um mês inteiro antes que um amigo visse um vídeo nas redes sociais, datado do início de setembro de 2022. Ele informava que 13 crianças da Escola Especial Kupyansk haviam sido transferidas para o leste, para uma instalação semelhante em Svatove, ainda sob controle russo.
Quinze dias depois disso, o telefone de Tetyana tocou com uma mensagem: Sasha estava em uma escola especial em Perevalsk e sua mãe poderia ligar para falar com ele.
"Ele ficou feliz em me ouvir, é claro. Mas chorou muito", lembra Tetyana sobre o momento em que conversaram. "Eles disseram a ele que nossa casa havia sido destruída e ele estava com medo de que nós também tivéssemos ido embora."
A comunicação com áreas de combate intenso não é fácil, mas as crianças de Kupyansk passaram por três instituições antes que alguém tentasse entrar em contato com algum parente.
"Ninguém fez nada. Apenas em Perevalsk, e mesmo assim não imediatamente. Acho que eles fizeram isso de propósito", diz Tetyana.
Mas a luta não acabou aí.
Ela ainda precisava ir buscar Sasha pessoalmente, mas a rota direta até o local cruzava a linha de frente da guerra.
Em vez disso, Tetyana viajou pela Polônia e pelo Báltico antes de cruzar a pé para a Rússia, onde o Serviço de Segurança da FSB (órgão de segurança do Estado) a interrogou sobre os movimentos das tropas ucranianas.
Ela não tinha nada para contar.
"Estava escuro, havia postos de controle, homens com balaclavas e armas. Fiquei tão assustada que tomei comprimidos para me acalmar", lembra Tetyana sobre o resto da viagem ao leste da Ucrânia ocupada.
Ela tinha outro motivo para estar com medo. A essa altura, a Rússia estava abertamente tirando crianças de lares de idosos em áreas ocupadas e colocando-as para viver com famílias russas.
O canal no Telegram da Comissária Presidencial para os Direitos das Crianças está repleto de vídeos em que ela aparece escoltando grupos de crianças ucranianas através da fronteira, onde jovens perplexos são recebidos por pais adotivos russos com presentes e abraços enquanto são filmados.
Enviamos dois pedidos de entrevista para Maria Lvova-Belova e não obtivemos resposta. Mas a mensagem de todas as suas postagens é clara: a Rússia é o mocinho na situação que ainda se recusa a chamar o que está ocorrendo na Ucrânia de guerra. A Rússia afirma estar salvando crianças ucranianas.
Na época em que Sasha desapareceu de Kupyansk, Vladimir Putin já havia alterado a lei para tornar mais fácil para as crianças ucranianas obterem a cidadania russa e serem adotadas.
No final de setembro, ele anunciou a anexação de quatro regiões da Ucrânia, incluindo Luhansk, onde Sasha estava localizado.
Em público e online, Maria Lvova-Belova referiu-se repetidas vezes às crianças daquelas regiões como "nossas". Ela adotou um adolescente de Mariupol, postando fotos com o novo passaporte russo dele.
"Eu temia que, se eles levassem Sasha para a Rússia, eu nunca o encontraria. Eu tinha medo de que ele fosse colocado em uma família adotiva, simplesmente", Tetyana me conta.
"O que nossos filhos têm a ver com isso? Por que eles fizeram isso conosco? Talvez seja apenas para nos causar dor, como com todo o resto."
Quando ela finalmente chegou a Perevalsk, depois de exaustivos cinco dias na estrada, Tetyana abraçou seu filho com força. Sasha não disse uma palavra. Ele apenas chorava de felicidade.
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